A Ilíada foi originalmente transmitida oralmente por gerações de aedos (poetas cantores) antes de ser fixada por escrito. A autoria é tradicionalmente atribuída a Homero, cuja existência histórica é debatida por estudiosos. Mesmo assim, sua obra permanece um marco fundamental da cultura grega antiga.
Apesar de estar ambientada na Guerra de Troia — um conflito mítico entre os gregos (aqueus) e os troianos — A Ilíada não narra toda a guerra, mas apenas um curto período, aproximadamente 50 dias, no décimo ano do cerco à cidade. O núcleo da narrativa gira em torno da ira de Aquiles, o maior guerreiro grego.
Aquiles se desentende com Agamenon, comandante dos aqueus, quando este lhe toma a escrava Briseida. Ofendido e sentindo-se desonrado, Aquiles se recusa a lutar. Essa decisão tem consequências desastrosas para os gregos, que passam a sofrer pesadas derrotas.
A morte de Pátroclo, amigo íntimo de Aquiles (em algumas leituras, seu companheiro), pelas mãos de Heitor, príncipe de Troia, é o ponto de virada da trama. Tomado pela dor e pelo desejo de vingança, Aquiles retorna ao campo de batalha. Ele mata Heitor em um duelo épico e, num gesto de fúria e desrespeito, arrasta o corpo do inimigo ao redor dos muros de Troia.
1. A ira (mênis) de Aquiles
Logo no primeiro verso, Homero invoca a musa para cantar a “ira de Aquiles”, que trouxe sofrimento aos aqueus. Essa emoção é o motor do enredo e um símbolo da condição humana. A Ilíada explora as consequências da cólera desenfreada, da honra ferida e da busca por reparação.
2. Honra e glória (timê e kleos)
Os heróis gregos eram movidos por ideais de honra e glória. Participar da guerra era a forma de alcançar a imortalidade simbólica, tendo seu nome lembrado pelos séculos. A desonra era, portanto, pior que a morte. Aquiles se recusa a lutar porque se sente desrespeitado por Agamenon, que lhe rouba a dignidade ao tomar sua escrava.
3. Destino e intervenção divina
Os deuses do Olimpo têm papel ativo na trama, interferindo diretamente nos acontecimentos humanos. Zeus, Atena, Apolo, Hera e outros deuses apoiam ou prejudicam diferentes lados do conflito, refletindo as paixões humanas em escala divina. Mesmo assim, há um destino traçado, e nem os deuses podem alterá-lo totalmente.
4. Guerra e sofrimento
Embora a guerra seja o pano de fundo heroico, Homero não romantiza o sofrimento. A Ilíada descreve a brutalidade dos combates com crueza, ressaltando as dores dos soldados e a tristeza dos que ficam para trás. A figura de Príamo, implorando pelo corpo do filho morto, humaniza o “inimigo” e expõe a tragédia universal da guerra.
A Ilíada é considerada a matriz da literatura ocidental. Foi recitada por séculos em escolas e festivais da Grécia Antiga, formando a base da educação helênica. Suas personagens, como Aquiles, Heitor, Agamenon, Ulisses, Helena e Páris, tornaram-se arquétipos literários e inspiraram incontáveis obras, do teatro à filosofia, da pintura à música.
Filósofos como Platão e Aristóteles referiram-se à Ilíada. No mundo moderno, a obra segue influente: desde traduções célebres até releituras contemporâneas em romances, filmes e até videogames.
Sua linguagem poética, marcada pelo uso de fórmulas fixas e epítetos (como “Aquiles, o de pés ligeiros”), indica seu caráter oral. No entanto, mesmo com estrutura repetitiva, a narrativa é sofisticada, cheia de nuances emocionais e filosóficas.
Assim, a Ilíada permanece viva não apenas como documento literário, mas como espelho da alma humana — com suas glórias, suas feridas e sua eterna busca por sentido diante do destino.